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Possibilidade e oportunidade na crise


Entrevista TSTS 221 13 de outubro de 2020 | Por: Portal TS
Possibilidade e oportunidade na crise

Não é falácia, é outro modo de enxergar novas aberturas diante de um cenário imprevisível. Conheça a visão de Paulo Castelo Branco, presidente da ABIMEI, que traz as análises de seu setor frente aos acontecimentos de 2020

por Ana Carolina Coutinho

Paulo Castelo Branco: “Antes era ‘Exportar é o que Importa’; e agora será “Importar Bens de Capital, Máquinas e Equipamentos que trazem Tecnologia e o que Exporta’”

 

Que me perdoem os puristas gramaticais, mas os chavões, às vezes, sintetizam claramente toda uma situação em poucas palavras. Em crises como a que estamos vivenciando mundialmente nada como trazer a história do vendedor de lenços: “Enquanto tem gente chorando, tem gente vendendo lenço”. Na verdade, ela essencialmente mostra que há, sim, oportunidade nos piores cenários, você só precisa enxergá-las e, claro, trabalhá-las.

Pode-se dizer que o entrevistado desta edição é uma dessas pessoas. À frente de um setor que baliza tanto a indústria nacional quanto a internacional, já que preside a Associação Brasileira dos Importadores de Máquinas e Equipamentos Industriais, ele tem uma visão abrangente das tendências mundo afora e como elas impactam diretamente a economia do Brasil. Sem ‘papas na língua’ – para nãos perdermos o gancho dos chavões –, ele desdobra o cenário atual por meio de seu olhar calcado na indústria e na balança comercial; e antevê, sim, uma melhora; contanto que as plantas se atualizem tecnologicamente: um esforço impulsionado pela própria crise atual. Os investimentos nesta área não pararam. “Somente para a adequação a realidade da Indústria 4.0 são previstos alguns bilhões de reais em investimento para os próximos cinco anos”, contou. Confira na íntegra.

Hoje qual o cenário da indústria brasileira? Qual a diferença para a indústria internacional neste momento?

O cenário atual da Indústria brasileira é, em média, de defasagem tecnológica em relação a máquinas e equipamentos industriais de 20 anos, se comparada aos demais países do mundo. O que gera baixa produtividade e falta de competitividade.

Como a ABIMEI vem sentindo a expectativa industrial no Brasil?

A expectativa industrial do Brasil infelizmente é preocupante e de falta de previsibilidade para uma mudança, visto que nos últimos seis anos o país lutou com uma crise bastante profunda que fez com que se tornassem raras as possibilidades de investimento em novas tecnologias - isto devido a vários fatores, como falta de demanda, taxas de juros altas, falta de crédito para investimento, taxa cambial oscilante e alta, carga tributária como proteção de mercado para importação de máquinas e equipamentos -, ou seja, tecnologia alta.

Como a importação de equipamentos reflete a economia do Brasil de um modo geral?

A importação de equipamentos reflete de maneira positiva na economia, pois permite a atualização do parque industrial brasileiro, fazendo com que este possa se adequar e ser produtivo, competitivo, capaz de produzir produtos finais manufaturados, adequados para abastecer o mercado interno e ainda possibilitar a exportação para outros países.

Qual a estimativa da ABIMEI para a retomada?

Esta é uma pergunta difícil de ser respondida, pois ainda temos uma situação difícil devido a Pandemia do Covid-19 e não sabemos o tempo de duração. Mesmo que algumas regiões tenham apresentado um decréscimo nas taxas de contaminação e mortalidade, o país ainda possui números assustadores que fazem com que grande parte da população permaneça com uma vida anormal em vários sentidos, incluindo profissionais de consumo e de investimento.

Diante de um futuro tão incerto, qual a estratégia da associação para manter um equilíbrio econômico no setor?

Diante de tudo o que já ocorreu neste ano de 2020, e a falta de previsibilidade, falo em nome de nossa categoria e associados, por isso digo que estamos tentando nos reinventar inovando nossas formas de operação comercial e de assistência aos clientes finais dos equipamentos através do uso mais intenso da nossa capacidade tecnológica, de atendimento remoto via canais digitais, com a utilização de ferramentas que já vinham sendo desenvolvidas e que agora, mais do que nunca, são necessárias, como a inteligência artificial e a realidade aumentada para a assistência à distância, transmissão de dados das máquinas e equipamentos via internet e outras que estão sendo implantadas.

Qual a sua opinião pessoal sobre os impactos econômicos da Covid-19 no Brasil?

Infelizmente os impactos serão fortes na economia e na nossa atividade industrial, como vem sendo mostrado pelos resultados recém-divulgados do PIB. Creio que o único ganho que estamos tendo é a antecipação da digitalização da manufatura que, em virtude da necessidade, está fazendo com que todos antecipem os planos de realizar as operações de forma digital em todos os aspectos possíveis.

Dólar nas alturas, pandemia, crise econômica... Quais as dicas (pessoais) para se manter operante diante desse cenário?

Pergunta difícil de responder, mas acho que o câmbio já estava defasado e por isso permitiu este avanço de mais de 40% na taxa cambial desde o início deste ano. A tendência, salvo qualquer evento não previsto, é de que a taxa média alcançada nesses últimos meses se mantenha no mesmo patamar, fazendo com que os investimentos fiquem onerados, porém, pensando por outro ângulo, este mesmo câmbio faz com que os produtos finais manufaturados importados de outros países fiquem mais caros. Este fato traz a possibilidade, e a oportunidade, de que possam ser produzidos mais produtos no mercado interno para haver disponibilidade desses mesmos produtos com uma mesma qualidade e com preços atrativos para fornecimento no mercado local e com possibilidade ainda de exportação para outros mercados, incentivando, dessa forma, os investimentos em produção industrial.

Como a realidade atual está inserida na balança comercial? Nesse sentido, qual o objetivo do setor?

A realidade atual, justamente, está inserida no equilíbrio da balança comercial, ao meu ver, desde que se possam facilitar e incentivar a importação de máquinas e equipamentos com alta tecnologia diferenciada, com um prazo de entrega viável e com um preço que, mesmo elevado pelo aumento da taxa cambial, ainda favorável para que sejam nacionalizados produtos e/ou componentes anteriormente importados e, dessa forma, seja aumentada a produção local desses produtos para abastecer o mercado interno (diminuindo essas importações de componentes e bens manufaturados) e aumentando a exportação para outros países. Ou seja, a frase que define bem o que vai dar este equilíbrio da balança comercial, curiosamente usando uma frase que se usou muito nas décadas de 1980 e 1990 modificada: antes era “Exportar é o que Importa”; e agora será “Importar Bens de Capital, Máquinas e Equipamentos que trazem Tecnologia e o que Exporta.”

Qual a perda real do setor de importação de equipamentos industriais?

Eu sou positivista e acho que se levarmos em conta o resultado acumulado no ano até o momento, e com as recentes informações de aumento na demanda por máquinas e equipamentos importados que estavam em estoque no Brasil em alguns setores industriais – o que está causando e notando, inclusive, a demanda e falta de máquinas para pronta entrega -, creio que ainda estamos com um aumento em relação ao ano passado. Isso também devido ao movimento forte de importação de máquinas e equipamentos que houve no final de 2019 para entrega no primeiro trimestre de 2020, mas vamos ver o fechamento deste ano como vai ser.

Quais são as ações da ABIMEI para minimizar os impactos da crise?

Estamos negociando o apoio do Ministério da Economia de uma linha de crédito para a compra de máquinas e equipamentos importados com prazo e taxas atrativas para tentar viabilizar mais projetos de investimentos ainda este ano, além de orientar melhor os nossos associados sobre a possibilidade de exoneração dos impostos de importação para máquinas e equipamentos e dos impostos que esta ação traz como reflexo. Este foi um grande ganho obtido com a mudança das regras no ano passado em trabalho realizado junto ao Ministério da Economia.

Além do segmento automotivo, que se comportou um pouco melhor nos últimos meses, qual outro setor está com números mais otimistas? Há uma razão para isso?

Além do segmento automotivo, o segmento de linha branca de eletrodoméstico, o da construção civil, de implementos rodoviários e outros vêm se apresentando mais otimistas e liberando investimentos. Isso devido a alguns fatores, como maior equilíbrio de consumo, no caso dos dois primeiros setores, e nos outros dois devido às baixas taxas de juros e disponibilidade de crédito, além do ótimo resultado obtido no setor do agronegócio, com a exportação que tem colaborado também.

De outro lado, qual o setor mais afetado?

Creio que o setor de serviços e das micro e pequenas empresas de varejo.

Ambas as repostas refletem também o cenário mundial?

Creio que sim, exceto é claro as características regionais de cada país e da sua atividade econômica principal.

Qual tipo de equipamento industrial é o mais importado atualmente? Nesse sentido, qual é a tendência?

Hoje temos diversos tipos de equipamentos sendo importados e é difícil dizer um específico, pois esses estão em várias áreas de nossos associados, como máquinas-ferramenta, conformação de metais, transformação de plástico, automação e robotização e ainda acessórios industriais.

Qual é o país que mais exporta equipamentos industriais para o Brasil?

Hoje temos uma divisão entre alguns países, como Alemanha, Japão, Itália, China, Coreia do Sul e Taiwan.

A automação das plantas ainda é uma realidade palpável? Qual estimativa de investimento nessa área?

Sem dúvida esta talvez seja a única realidade palpável, pois as indústrias, cada vez mais, se dão conta da necessidade da automação. A estimativa é bem alta, somente para a adequação a realidade da Indústria 4.0 são previstos alguns bilhões de reais em investimento para os próximos cinco anos.

Como o Sr. enxerga o setor de Tratamento de Superfície em termos de equipamento industrial?

Eu pessoalmente não tenho um conhecimento profundo nesta área, mas acho que tem uma grande perspectiva se levarmos em conta que a área da construção civil está se demonstrando como uma das áreas em franca expansão.

Qual a principal tendência em Tratamento de Superfície para equipamentos industriais?

Tenho certeza que, como nos outros setores, necessitará importar equipamentos com alta tecnologia rapidamente para poder suprir as necessidades demandadas pelo mercado.

Afinal, 2020 é um ano para ser ‘cancelado’ ou, melhor, quais lições o executivo industrial do Brasil pode tirar deste período?

Como sou considerado um ‘economista, liberal e positivista’, nunca acho que as lições são perdidas ou que não existe o outro lado da moeda. Creio que aprenderemos com tudo que estamos passando neste ano de 2020. As indústrias brasileiras acharão – como nos é peculiar por sermos brasileiros e já termos passado por muitas crises, mesmo sendo esta de uma forma diferente e dolorosa pelas perdas humanas, – uma maneira de se reinventarem  e seguir em frente.

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