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Indústria 4.0, a sua implantação deve ser o destino ou a jornada?


TS 219Opinião Executiva 10 de abril de 2020 | Por: Portal TS
Indústria 4.0, a sua implantação deve ser o destino ou a jornada?

Casos reais da transformação de uma indústria ‘analógica’ para a 4.0 dão as dicas necessárias para você começar já

Camilo Ramos

Administrador, Consultor e Diretor de Operações na Piccin Tecnologia Agrícola

camilo@believedho.com

Após palestrar para mais de 85 representantes de empresas presentes em um evento organizado sobre a “revolução que vivemos”, fui abordado por alguns participantes que traziam diversas dúvidas a respeito desse tema. A grande maioria tem dificuldade de enxergar suas empresas utilizando processos baseados em big data e analytics, robôs autônomos, simulação, realidade aumentada, integração de sistemas, manufatura aditiva, cybersegurança, nuvem e internet industrial, os nove pilares do avanço tecnológico rumo a indústria 4.0.

Normalmente, respondo com outra pergunta esses questionamentos: “Imagine que você tem agora um projeto para revolucionar o modelo de gestão da sua indústria, o que você considera mais importante nesse projeto o destino ou a jornada?

Talvez, preocupados com minha indagação a resposta padrão seja: “Claro que é mais importante a jornada! A fase de preparação, planejamento, investimento, etc.... Só depois de tudo isso atingiremos o destino!”. E eu sempre complemento, dizendo: “ERRADO! Se você quer implantar um modelo de indústria 4.0 é preciso ter muito claro, em sua mente, o destino, os seus benefícios. Você deve insistir com sua mente até enxergar sua empresa como uma companhia 4.0 utilizando processos baseados nos nove pilares da transformação”.

Após entender, de fato, quais benefícios sua empresa usufruirá, é importante listar dentro de todos seus processos quais deles podem trazer resultados mais rápidos após a implantação e quais podem ser transformados de forma mais rápida, sempre olhando para os nove pilares do avanço tecnológico da indústria 4.0.

Os Nove Pilares

A imagem a seguir foi criada pelo The Boston Consulting Group para apresentar didaticamente os nove pilares do avanço tecnológico da indústria 4.0. Tenho uma dessas coladas em frente à minha estação de trabalho na empresa e em meu escritório em casa, sempre que tiro o olho da tela do computador ou de uma página de livro já vejo a ilustração e logo pondero se o que estou fazendo naquele exato momento está alinhado de alguma forma com um dos nove pilares do avanço tecnológico.

Essa foi a forma que encontrei de me atentar se as decisões que tomo estão ou não alinhadas com a transformação. A imagem com os pilares é o meu destino e as ações para transformar os processos, a equipe, a cultura da empresa é a jornada para alcançar esse destino. Pratique, pois, com o passar do tempo, você mentaliza e passa a fazer essa análise de forma automática.

Recentemente na empresa, analisava três problemas críticos levantados nas áreas sobre minha responsabilidade. Listei-os em uma folha em branco e também escrevi algumas prováveis soluções para eles. Logo após, comecei a realizar movimentos alternados entre olhar para a imagem fixada na parede (jornada) e olhar para a folha com as soluções dos problemas, pensando como poderia executar as soluções já em processos 4.0.

Passei um longo período do dia realizando esse exercício e, após acreditar que já havia esgotado todo meu estoque de criatividade, reuni as equipes de cada área relacionada com os problemas e fiz o mesmo exercício junto a eles. Novos insights surgiram. Após listar todos, o grupo definiu quais insights trariam resultados imediatos à empresa e quais estavam mais fáceis de serem colocados em prática, considerando tempo, valor de investimento e risco. Como resultado, tivemos um plano de ação com atividades em execução (jornada) para só então atingir os resultados (destino).

Caso prático

Na fabricação de implementos, um processo comum é o processo de solda e, dependendo do modelo da peça, posição e outros fatores não é viável a robotização do processo de soldagem. Em um dos processos manuais de solda foram apontados 18 problemas relacionados a soldagem que geraram retrabalho e, consequentemente, custos.

Para esse problema em especial propusemos uma solução no modelo tradicional e também uma solução já pensada junto aos nove pilares do avanço tecnológico:

Solução modelo tradicional: investir em capacitação, criação de processos de qualidade, aumentar o quadro de inspetores de solda especialistas e auditar por amostragem através de inspeção visual de solda.

Solução indústria 4.0: o líder responsável pelo setor receberá, automaticamente, relatórios gerados pelas máquinas que estão conectadas na rede – e analisados previamente pela inteligência artificial – sobre quais peças, ordem de produção e operadores apresentaram falhas no momento da soldagem, conforme parâmetros aceitáveis cadastrados. Também automaticamente, o sistema receberá os dados gerados pela máquina, correlacionando-os ao tipo de peça, dia da semana, condições climáticas, informações do RH, consumo de insumos... Podendo, inclusive, serem utilizados pelos líderes para a tomada de decisões, evitando que esses problemas de solda voltem a acontecer. Por exemplo, o sistema poderá identificar que determinado soldador aumenta a incidência de erros sempre um dia após apresentar um atestado de saúde.

Nesse caso específico, optamos pela Solução 2 e ela passou a ser nosso destino, ou seja, onde queremos chegar, os resultados que queremos atingir. Já as ações para alcançarmos a Solução 2 foram para um plano de ação que já está em andamento e passou a ser, agora, a nossa jornada.

É importante destacar que, para a transformação desse processo de solda em um processo 4.0, não foi necessário nenhum projeto grandioso com um investimento exorbitante. Bastou apenas exercitar formas de transformar o processo em 4.0 junto com a equipe e, com o engajamento dos times de manutenção e de TI, foi criado um dispositivo que inicia a coleta de dados de solda pelo custo de R$ 400,00, a unidade. Após a geração de dados, big data, é iniciada a fase de analytics e essa sim poderá nos surpreender.

Já vi histórias comprovadas em números e relatórios de uma indústria do estado de São Paulo. Entre elas, a descoberta, através da inteligência artificial, que determinado setor da indústria tinha uma queda em produtividade às segundas-feiras sempre quando certo time de futebol perdia o jogo no domingo.

A tratativa para esse problema não acompanhei, entra aí uma longa discussão sobre a transformação das empresas para lidar com esses problemas, até então desconhecidos – e a esse tópico cabe outro artigo – mas o fato é que no modelo tradicional de gestão, sem ajuda das novas tecnologias, jamais seríamos capazes de atingir tamanha precisão no detalhamento de causas de problemas.

Derrubando mitos sobre a transformação para 4.0

Cito alguns pontos que considero importantes no processo de transformação para indústria 4.0:

  1. Gestores compreenderem que indústria 4.0 não é mais uma ‘modinha passageira de gestão’;
  2. Indústria 4.0 não é uma transformação que acontece apenas no chão de fábrica, mas, sim, em todos setores da empresa;
  3. Empresas que perdem muito tempo tentando emplacar projetos com proposta 4.0 junto a seus gestores já deram um grande passo para perder essa corrida, pois, atualmente, a evolução é exponencial e enquanto você não faz uso dessas ferramentas, ou luta para convencer algum gestor a usar, o seu concorrente já utiliza e evolui significativamente mais rápido que você;
  4. Se você é um gestor e culpa algo ou alguém para não utilizar um processo 4.0 está na hora de repensar seu destino e reprogramar sua jornada: a transformação depende de você! Vá imediatamente buscar conhecimento sobre essa revolução, abuse da criatividade para desenhar o destino dos processos sobre sua responsabilidade, monitore, e dê condições para a jornada que deverá ser cumprida;
  5. Treine sua equipe para a revolução, comece pela conscientização sobre a 5ª revolução industrial, pois muitos ainda não têm consciência dessa transformação. Depois, evolua para ferramentas e cases de transformação. Problemas antes desconhecidos serão escancarados com ajuda da tecnologia e as áreas precisam estar prontas para encará-los;
  6. Inevitavelmente, investimentos em tecnologia, máquinas e capacitação serão necessários e, no atual cenário econômico, fica difícil planejar investimentos, por isso recomendo que sejam ordenados todos os processos com problemas que demandam uma transformação. Reordene essa lista pelos processos que podem atingir o destino através de uma jornada mais rápida e de baixo investimento, pois os resultados desses projetos menores serão os grandes patrocínios dos projetos de maior complexidade;
  7. Vivemos em uma era na qual algumas empresas têm trabalhando em conjunto, no mesmo departamento, as gerações baby boomers, geração X, Y e até mesmo a geração Z. O grau de compreensão da 5ª revolução é diferente para cada uma dessas gerações. Sendo assim, a abordagem do tema com cada indivíduo também é diferente. Pesquise a respeito de cada geração e encontre os melhores mecanismos de abordagem;
  8. Não encontramos no Brasil uma variedade de materiais que abordem o tema indústria 4.0 e mesmo nos materiais internacionais ainda não há conteúdo que aborde especificamente alguns processos, por isso é importante, uma vez entendido o conceito e suas ferramentas, que a transformação seja construída por você e sua equipe de acordo com a necessidade da sua empresa;
  9. Respeito. Se você pretende ser o agente de mudança e transformação deve, acima de tudo, respeitar as diferentes gerações com quem convive na empresa; deve respeitar o legado da companhia; a sua história jamais deve ser descartada e o passado deve servir de aprendizado sempre;
  10. Faça valer a afirmação: “feito é melhor que perfeito”! Tire do papel suas ações e comece a executar, não perca muito tempo com o planejamento; os menores resultados atingidos são a grande alavanca para alcançar os grandes resultados e a sua empresa já pode ter algum processo 4.0 sem que você saiba.

Acesse o conteúdo original publicado na revista Tratamento de Superfície, edição 219, página 47-49

Acesse a edição 219 digital | Abril 2020

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